Domingo, às 09:00 horas, dia de sol. Vou correr. Trajeto: 15 km pela canaleta do expresso.
Domingo, às 10:00 horas, dia de sol com vento. Será que corro de manga longa?
Domingo, às 11:00 horas, garoa e ventania. Muros pichados do Capão Raso. O que é que estou fazendo aqui? Por que não saí com mangas longas? Por que não fiquei dando voltas no Barigui?
Saí sem o Ipod, pois correr na canaleta do expresso requer atenção máxima. Ao correr nesse lugar, tem-se um asfalto razoável, pouco fluxo de veículos e menos cruzamentos. No entanto, corre-se em local não apropriado, no qual os ônibus tem prioridade absoluta. É você que está errado. Por isso, é necessário atenção a todos os barulhos. Correr sem Ipod é uma oportunidade única para ouvir os próprios pensamentos, sem ficar desnorteada pela mudança repentina de Weezer para Midnight Oil.
Hoje, às 11:00 horas da manhã, rodeada de cinza por todos os lados (céu, chão, muros), pensei como Curitiba é uma cidade de contrastes. Quem está acostumada a correr por ruas arborizadas, com flores, residências e lojas bem cuidadas, acha que mora no Upper East Side Curitibano. Ignora que um pouco abaixo ou acima dos limites imaginários da cidade, há outra cidade: cinza, sem flores e árvores. Curitiba tem seus Harlems, seus Queens e seus Bronx....
E, enquanto via a pichação, veio-me à mente o trecho da maratona de NY que passa pelo Harlem. Pensava ser nítida a separação entre a parte cosmopolita de Manhattan e o Harlem. Confesso que tinha a imagem do Harlem do começo dos anos 90, todo pichado. Lembro-me do guia da excursão dizendo para a gente não ficar tirando fotos (sei lá, podia ser terrorismo, mas eu como uma criança de 12, 13 anos fiquei bem impressionada). Quase quinze anos depois, volto ao Harlem correndo e o que vejo é um monte de gente sorrindo, brincando com os maratonistas. Vi flores, freiras batendo sininhos para nós, idosos sorrindo. Quanta mudança...Soube que até uma amiga ficou hospedada em uma Bed and Breakfast lá e amou a experiência.
Não sei se o Harlem realmente mudou ou isso é uma projeção da minha mente, pois foi no Harlem que recebi o maior apoio durante toda a maratona: um senhor negro e humilde, ao ver minha exaustão, começou a correr do meu lado e a gritar palavras de incentivo. Graças a ele consegui dar um sprint final de quase cinco quilômetros.
Coincidência ou não, enquanto pensava na Maratona de Nova York e no povo do Harlem, os guardadores de carro do Capão Raso (estava perto da Igreja) começaram a me incentivar e a aplaudir. Fazia muito tempo (desde novembro do ano passado) que não recebia qualquer incentivo da população no meio de uma corrida. Acho que nunca tive aplausos sérios durante treinamentos até hoje (sempre tem os engraçadinhos...). Mas os guardadores me gritaram palavras de incentivo do tipo: “vai lá, falta pouco, raça”.
A imagem do Capão Raso mudou...Deixou de ser aquele bairro cinza e pichado, para ser um bairro de pessoas, de gente que incentiva, de gente que não se incomoda em dar apoio aos atletas amadores da cidade. Passou a ser um bairro colorido, com a cor de gente. O Capão Raso, antes fora dos meus limites de conforto imaginários da cidade, passou a ser logo ali, distante apenas alguns quilômetros de casa...Um bairro de gente para a gente!
*texto escrito pela G_Myr para o blog. Uma grande honra.
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Um comentário:
Adorei teu blog!! Muito cultural!! Favoritado! Agora fica mais fácil explicar algumas coisas pros meus amigos estrangeiros que sempre perguntam de Curitiba... haha Achei muita informação aqui! rsrs Valeu!
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